Ao assumir como arconte na antiga Grécia, Sólon – a quem já me referi anteriormente – não somente optou por revogar praticamente todas as leis impostas por Draco (exceto a lei de homicídio se não me engano), mas tentou criar estruturas permanentes baseadas em princípios universais e em leis de Estado: aboliu a escravatura, os votos hereditários e censitários (baseado em renda) e até padronizou pesos e medidas; tinha a idéia de que a governança por meio das leis traria uma ‘boa ordem’, ou seja, eunomia.

Sólon considera seu trabalho acabado, abdica e deixa o país; em apenas quatro anos um de seus parentes, Pisístratos, toma o poder e inicia uma nova tirania hereditária – Sólon chama o povo ateniense de estúpido e covarde por deixar isso acontecer, mas não creio que sejam somente esses os motivos.

A históra de erros e acertos gregos continua com Clístenes entendo que era uma estrutura de poder centralizada – e não o regime em si – que permite o surgimento de tiranos; aumentou então a participação de cidadãos nas escolhas e nos serviços públicos somente para ver a instabilidade voltar a crescer pelo abuso do poder do povo, a chamada oclocracia. Não havia no modelo de Clístenes um contraponto ao poder das hordas e facções.

Hoje em dia, no Brasil, o termo ‘democracia’ é visto como um valor e não como algo efetivamente existe na realidade; como algo que se analisa do ponto de vista histórico e que se identifica (ou não) em nações ao redor do mundo. Qualquer crítica à ‘democracia’ é vista como ataque à um valor e sem um referente na realidade, mas o ponto é que a democracia enquanto vontade do povo não deve ser, necessariamente, o objetivo final de uma nação. A democracia deve co-existir em um sistema onde outros poderes independentes (e legítimos) limitem-se uns aos outros – é isso que demonstradamente traz a eunomia.

A constituição dos Estados Unidos (1787) e a primeira constituição do Brasil Império (1824) trazem essa idéia à vida com a perfeição que somente pessoas como os pais-fundadores do Estados Unidos e os Andrada e Silva – inspirados por pensadores como Montesquieu e John Locke – poderiam conseguir (Na Austrália a estrutura constitucional é um pouco diferente).

Com o tempo alguns dos conceitos descritos em tais documentos foram sendo minados, ocorre uma confusão entre os conceitos de Governo e Estado, o poder volta se a concentrar e centralizar, etc., causando novamente um desequilíbrio entre as forças responsáveis pela eunomia. Quando esse desequilíbrio está mais aparente, a impressão é de uma ‘desconfiança na democracia’, como visto aqui na Austrália (gráfico abaixo).

Discuto alguns desses fatores de desequilíbrio nos três países nos posts seguintes.